Jacqui Whinnett é uma daquelas entusiastas pelos Land Rover que já nasceu assim. Os modelos da marca de Solihull sempre fizeram parte da vida desta britânica, que em 2003 enfrentou um episódio de cancro e pensou que tinha os dias contados. Contados a breve prazo. E nas suas reflexões sobre a “despedida”, achou que gostava de fazer a “última viagem” num Land Rover. Mas não havia carros desses nas agências funerárias. Pois então, não só passou a haver, como sobreviveu e hoje lidera um negócio em que não lhe falta clientela. Até porque mais ninguém pode garantir que a vida seja toda em Land Rover até que a morte nos separe!
A morte é um tema controverso. É certo que ninguém gosta do tema, mas não é menos verdade que a morte e pagar impostos são as únicas duas certezas que já nascem connosco. E se alguns ainda conseguem viver até ao fim sem nunca pagar impostos, ou quase nunca, o certo é que nem esses escaparão da morte. E sabendo desta certeza, há mesmo quem prepare a sua “última viagem”.
Ora tratando-se precisamente da última viagem, porque não fazê-la com capricho? Por exemplo, nos Estados Unidos da América, os condenados à pena capital têm direito a um derradeiro capricho: antes da execução, escolhem a ementa da refeição que jamais irão ter tempo de digerir. A morte muitas vezes não se anuncia. Chega tão repentinamente que nem nos dá tempo de pensar nisso. Mas, infelizmente, também se anuncia cada vez mais, nomeadamente com doenças prolongadas. E entre elas, o cancro é quase que uma sentença.
Uma história que mostra como podemos renascer
Pois foi exactamente por ter sofrido de cancro que Jacqui Whinnett pensou neste assunto com seriedade. Esta britânica já era conhecida entre os entusiastas pelos Land Rover como uma das aficionadas mais fervosas. Ela trabalhava como organizadora de funerais e enquanto se debatia com o dilema de vencer ou ser vencida pelo cancro, imaginou o seu próprio funeral. Com competência, é claro, ou não fosse uma profissional reconhecida! E como a paixão pelos modelos fabricados em Solihull era imensa, ocorreu-lhe uma solução que lhe permitisse dar corpo ao lema “em Land Rover até que a morte nos separe”.
Encontrou a sua oportunidade num leilão de veículos militares que passaram “à disponibilidade”, como se diz na tropa. Comprou então um Defender 130, com motor V8 a gasolina, que o exército britânico tinha colocado ao serviço da artilharia. Foi usado para rebocar um lança-mísseis e ninguém seria capaz de adivinhar que tipo de serviço passou a ter, na “vida civil”?
Negócio a crescer…
Como “não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe”, Jacqui Whinnett não só sobreviveu à doença, mas a sua ideia para o próprio funeral fê-la renascer profissionalmente. Bastou aliar a paixão pelos Land Rover à experiência no ramo dos funerais, para criar uma empresa que oferecesse um serviço único. A Alpha 4×4 Funerals estreou-se no mercado em 2004.
O Defender 130 foi totalmente transformado, inclusive em termos de mecânica: o motor V8 a gasolina original foi substituído por um quatro cilindros em linha turbodiesel, da série 300 Tdi. A pintura verde tropa deu lugar a um elegante Zambezi Silver, escolhendo o prateado para evitar o mórbido preto. E o interior recebeu uma plataforma forrada em madeira de raiz de nogueira, onde um caixão cabe perfeitamente.
Para que a cerimónia seja toda feita em Land Rover, Jacqui comprou um Defender 110 Tdi para transportar os acompanhantes, no cortejo funerário. Com oito lugares, este 110 Station Wagon foi igualmente pintado em Zambezi Silver e recebeu estofos de couro e um eficiente sistema de ar condicionado.
Serviço “especial” para entusiastas mais clássicos
Há muitos anos, havia um anúncio publicitário da Land Rover que dizia qualquer coisa como “em muitos lugares do mundo, o primeiro veículo que alguém viu foi um Land Rover”. Hoje também se podia dizer que o último em que alguns viajaram foi um Land Rover. Passe o humor negro, tão comum aos britânicos, hoje a Alpha 4×4 Funerals pode até assegurar que o veículo da primeira e da última viagem sejam o mesmo modelo…
A terceira viatura a integrar a frota da companhia de Jacqui Whinnett foi um Land Rover Series One 107. O primeiro modelo de chassis longo fabricado em Solihull. Neste caso, trata-se de uma pick-up, com capota de lona. Foi rigorosamente restaurado e o seu estado sem mácula é reconhecido pela atribuição do correspondente certificado, por parte do clube de Land Rovers clássicos.
A operação com o Land Rover 107 recebeu bom acolhimento, mas colocou um problema à agência: como o modelo não consegue senão rodar, no máximo, a 60 quilómetros por hora, não era possível usá-lo para serviços muito longe da base da companhia, em Inglaterra.
Uma vez mais, Whinnett não tardou a resolver o problema, para poder atender a todos os pedidos deste serviço “clássico”: comprou um reboque de sete toneladas, para carregar o 107 até onde for preciso! E volvidos 15 anos de operação, a agência de Jacqui já não está sozinha nesta oferta para os entusiastas pelos Land Rover. Mas continua a não ter um negócio sólido. Quem sabe se a ideia um dia não chega até nós, nem que seja para romper com o “cinzentismo” das nossas cerimónias fúnebres?
Peça de colecção para apreciadores
Texto: Alexandre Correia
Fotos: Alpha 4×4 Funerals/D.R.